Indago do eventual leitor se ele comeria uma picanha salpicada com …ouro? !!!! Eu não o faria por causa da dor na barriga, no bolso e, sobretudo, na consciência, sabendo que trinta milhões de brasileiros têm para comer somente a sola de sapato que o inesquecível Carlitos comia, no filme “Em busca do ouro”.
Assim não pensaram os nossos heróis do tetra, do penta e do he…(hêhêhê). O Mundo inteiro viu os craques canarinhos numa churrascaria no Qatar, saboreando a iguaria ali servida e o “chef” jogando o ouro em pó sobre a carne. Eu preferiria outro tipo de tempero, menos indigesto sob todos os aspectos, como o sal grosso, a pimenta ou o molho de tomate.
Todos sabemos que alguns privilegiados jogadores são milionários, seja pela sua competência, ou pelas oportunidades que tiveram. Mas, este não é o comum da profissão. Recente pesquisa Datafolha mostra que mais da metade dos jogadores profissionais brasileiros ganham um salário mínimo.
Que os craques que foram para um convescote no Qtar queiram fazer um “comercial”, exibindo globalmente os seus egos, é um direito que lhes assiste. É importante ressaltar, no entanto, que nesta condição de figuras públicas, é preciso ter em conta que eles são exemplos para milhões e milhões, Brasil e mundo afora. Todos eles com milhões de seguidores em redes sociais.
O interessante é que esta ostentação desmesurada não foi vista por parte dos principais futebolistas da atualidade: o português Cristiano Ronaldo, o francês Mpabbe e o argentino Messi.
É sintomático que este farnel, digno das mil e uma noites, tivesse se passado no Qtar, país onde os Xeiques, lambuzados de ouro negro ou dourado, oprimem os seus pobres habitantes, mormente estrangeiros, que trabalham em regime de semi-escravidão. É sabido que milhares de trabalhadores morreram na construção de suntuosos estádios que abrigaram os jogos da copa do mundo.
Sou amante do futebol e desde 1958 acompanho as seleções. Evidentemente, que nunca assisti presencialmente a qualquer competição. Acho, entretanto, que a “dinheirama” que tem sido despejada sobre meninos ainda não estruturados está mexendo grandemente com as suas cabeças. Os casos recentes nas páginas policiais demonstram isso.
É evidente que não se pode generalizar. Soube, por exemplo, que o centro avante Richarlison doa para a caridade dez por cento do que ganha. Acredito que há outros que também o façam.
Preferia o tempo em que o jogador Garrincha, quando chamado na tesouraria do Botafogo para receber o seu primeiro salário, exclamou: “poxa, ainda me pagam para isso!”
O que nós torcedores esperamos dos nossos craques é menos salto alto, menos glamourização, menos ostentação e, de preferência… mais futebol.
Por Nilson Bortoloti (Professor aposentado,
ex-prefeito e ex-vereador em Muzambinho)