“Permanecei em mim, e eu permanecerei em vós.” (João 15:4)
O Natal chega todos os anos envolto em luzes, cantos e memórias afetivas. Mas, em sua essência mais profunda, ele não celebra apenas um nascimento ocorrido no passado. O Natal anuncia uma permanência. Cristo não veio para uma visita breve à história humana; veio para habitar, para ficar, para criar vínculo. Não é um Deus que passa — é um Deus que permanece.
Quando Jesus fala em permanecer, Ele desloca o sentido da fé do exterior para o interior. Não se trata de um lugar geográfico, de um templo específico ou de um dia marcado no calendário.
Trata-se de um laço vivo. Permanecer é estar ligado, como o ramo à videira, nutrido por uma seiva que não se vê, mas que sustenta a vida.
O clima natalino nos convida exatamente a isso: ao recolhimento, à suavização dos gestos, à reconciliação possível. Há presenças que não fazem ruído, mas mantêm tudo em pé. Assim como o calor silencioso aquece uma noite fria, a presença de Cristo organiza o interior humano quando encontra espaço para permanecer.
Permanecer não é inércia; é escolha. É decidir, dia após dia, manter o coração aberto quando seria mais fácil endurecer.
Quando vontades se alinham ao amor, cria-se uma harmonia real. No plano espiritual, essa harmonia chama-se comunhão. É nela que Cristo habita.
O nascimento celebrado no Natal introduziu no mundo uma lógica nova: a força que nasce da fragilidade, a grandeza que se revela na simplicidade, o poder que se manifesta no cuidado. Um Deus que se faz criança ensina que a transformação não vem da imposição, mas do vínculo.
Até o corpo reconhece essa verdade. Estados de paz, confiança e gratidão reorganizam o ritmo interno, acalmam a mente e ampliam a respiração. O espiritual atravessa a matéria. Quando Cristo permanece no interior, algo se aquieta, algo se cura, algo floresce.
Por isso, Ele não depende de datas nem de adornos. Cristo permanece onde há acolhimento, onde o outro é respeitado, onde o amor encontra morada. Permanece no abraço sincero, na palavra mansa, no silêncio que cuida.
Neste Natal, mais do que celebrar, somos convidados a permanecer. Permanecer no amor quando o mundo insiste na ruptura. Porque onde a vida permanece, Cristo sustenta, transforma e faz nascer esperança — mesmo nas noites mais longas.
Mauro Falcão, pesquisador e escritor brasileiro