Ao tentar superar dificuldades, tenho o costume de reler “Razão e Sensibilidade”, um romance da escritora inglesa Jane Austen (1775-1917). O pouco que se sabe da vida dela tem um efeito desproporcional na forma como podemos ler seus romances, protagonizados por heroínas espirituosas, atraentes e pobres. Ao dar conselhos para um jovem escritor com dificuldades em estruturar uma história, Jane Austen sugere um enredo: “Três ou quatro famílias de uma aldeia rural são ideais para se trabalhar bem”. Outra sugestão: “Livros a gente não faz como faz filhos, mas como as pirâmides, com um projeto premeditado, e colocando grandes blocos uns sobre os outros, à força de braços, tempo e suor”. – Ela tinha uma aguda consciência dos defeitos humanos e um desejo profundo de tornar as pessoas melhores: menos egoístas, mais sensatas, mais dignas e mais sensíveis às necessidades dos outros. E essa fórmula está na essência de seus romances. Eles examinam a política social de um pequeno círculo, e particularmente o que cabia às mulheres na época em que os costumes de herança patriarcal faziam com que um bom casamento fosse a forma ideal de sobrevivência. Estruturados, talvez inevitáveis pelas convenções do enredo entre personagens, os romances de Austen revelam um dom extraordinário para comentários sociais penetrantes, além de muito irônicos.
Há pouco tempo, li um conto do também escritor inglês Rudyard Kipling, intitulado “The Janetes”, em homenagem à obra e à influência de Jane Austen. Conta a história de soldados britânicos na Primeira Guerra Mundial, encurralados nas trincheiras e procurando escapar dos horrores da guerra; inclusive o próprio filho de Kipling. O único soldado que sobrevive à matança, comenta aliviado: “Não há quem supere Jane Austen quando se está em dificuldades!” – É isso.
Paulo Augusto de Podestá Botelho é Professor e Escritor.
Visite o Site https//paulobotelhoadm.com.br
