Um tanto arrogante, aparência de uns 40 anos, vestia um terno grafite de corte em alfaiataria, moda sem-gravata. Ao estender a mão em resposta ao meu estender, mal apertou; e observei possuir uma mão delicada, macia, quase feminina. Principal dirigente daquela unidade hospitalar, havia agendado comigo uma conversa sobre palestras de treinamento direcionadas ao pessoal de enfermagem. – “Quero que toda a enfermagem seja adestrada!” – Disse com determinação.
Ao pedir permissão para entrevistar o pessoal, concordou a contragosto. No decorrer das entrevistas, constatei relatos de agressão por parte de acompanhantes dos pacientes. – Uma enfermeira relatou que atendeu uma mulher com dores abdominais. “O marido dela me deu um tapa no rosto porque não a atendi de imediato!” – Disse, segurando o choro. Demonstração de absurda intolerância, além de extrema covardia. – Homem que bate em uma mulher não é homem.
Situações como essa só contribuem para deslocar a atividade de atendimento para um problema de alto risco.
Enorme é a quantidade de palestras (ou cursos) de baixa qualidade a prescrever conteúdo pirotécnico e de efeito placebo ministrados por consultores picaretas.
Após dois dias de entrevistas, fui até a sala refrigerada daquele dirigente e disse que iria propor um outro enfoque ao invés de “palestras de adestramento”. – Entretanto, ele não concordou e encerrou o assunto. – Sequer me estendeu de novo aquela mão delicada ao despedir!
Cavalos podem ser adestrados porque só sentem; pessoas comprometidas com as outras não são adestráveis porque pensam e, sobretudo, porque sentem.
Paulo Augusto de Podestá Botelho é Professor e Escritor.
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